Lembranças de uma janela.

Não lembro ao certo qual era o assunto que proseávamos naquela tarde de domingo, lembro que estávamos sentados no banco comprido da mesa, fazendo o uso da luz que entra pelas janelas laterais aqui do hostel durante o dia. Na verdade talvez estivéssemos quietos… quase certo que estávamos quietos, ela lia um livro de cartas que tenho aqui, Cartas Extraordinárias, trás uma compilação de 125 “correspondências inesquecíveis de pessoas notáveis”, assim está escrito na capa.

Estávamos quietos mesmo, agora consegui me lembrar. Espetei um pedaço de queijo usando um garfo pequeno de madeira, desses que tem apenas um par de dentes e são usados para petiscar azeitonas e ovos de codornas cozidos, não me lembro o queijo, mas era um queijo gordo desses amarelos, cortei em formato de cubo em uma tabua também de madeira e deixei sob a mesa, também estavam duas canecas e uma garrafa de café que havia passado minutos antes, mergulhei o pedaço de queijo na caneca de café quente, esperei alguns segundos e então comi, muito me agradou o sabor e me pareceu um tanto familiar, me esforcei um pouco para tentar lembrar aonde eu havia comido queijo mergulhado no café, mas nada recente me veio a cabeça. Também não soube o porque tinha feito aquilo.

Espetei mais um queijo e pra dentro da caneca ele foi, antes mesmo deu comer esse segundo pedaço me veio a tona as papinhas que comia com meu avô João quando pequeno, sentado na janela do quarto dele, havia a janela e um espaço de não mais que 2 palmos e então, uma grade, ali eu sentava com os cambitos pra fora da grade e meu vô em pé do lado de dentro do quarto partilhava comigo uma caneca grande de papinha. Não foram poucas as vezes que, sem a presença do seu João e em outras situações que não essa quando estava ali para comer, meus irmãos fechavam a janela e eu então ficava trancado do lado de fora, esperando uma viva alma passar no quintal para pedir que abrissem a janela do lado dentro.

A tal papinha era de uma gostosura sem igual, café com leite quente, pedaços de pão de sal e o ultimo alimento, que trouxe a tona essa lembrança, pedaços de queijos, lembro-me como se fosse hoje pela manhã, cada colherada trazia 50% de chance de ter ou não um pedaço de queijo, era bom demais quando tinha, quando não tinha também acabava sendo.

Dos alimentos que compunham a papinha que Dona Elza fazia pra gente, eu consumo apenas o café e o queijo, mas daria um dente da frente e comeria o pão, tomaria o leite… se pudesse mais uma vez que fosse, partilhar uma papinha na janela com meu avô João. Que saudade daquele velho de fonética engraçada, ele não tinha o céu da boca, mas sempre entendi todo que ele falava, sempre… desde a época em que meus cambitos passavam naquelas grades da janela.

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