Everest, café e um plano para comprar o Paleobergue.

Esse texto era pra ser um daqueles textos, como a maioria dos que se lê aqui,  desimportantes, sem título, que começo com hora e data e acabo falando sobre um dia qualquer nas Gerais… mas o Everest puxou uma prosa e acabou virou um texto importante.

5:10p.m sexta-feira, 19 de Maio.
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Dia chuvoso por aqui, desde a madrugada que o barulho da chuva no telhado me faz companhia, agora divide a atenção com o barulho da madeira estalando e o ruído da agulha na vitrola. Acordei com o Everest me chamando para abrir a porta, não sei exatamente a hora, de certo era antes das 7, digo porque depois acordei novamente e ja eram 7:15. Conheço esse patife, devia de estar muito apertado para sair naquela chuva, ele não é muito chegado em água.
Voltei pra cama e peguei no sono sem um pingo de dificuldade, deixei a porta aberta pro Everest voltar pro sofá mas acredito que o vento acabou fechando, acordei novamente com ele, dessa vez foi o barulho das suas orelhas que me acordou, ele sacode a cabeça como se tivesse uma pulga atrás da orelha, uma pulga de verdade, parece aquele barulho que o moço que vende biju faz quando passa na rua gritando “Olha o Biju… tec tec tec tec! Olha o biju tec tec tec tec”.
Sequei suas patas com o pano que estava na porta, já perdi as contas de quantas vezes falei pra ele que deve fazer isso quando estiverem molhadas, as vezes parece que ele não entende o que eu falo, enfim…
A primeira parte do dia passou num piscar de olhos, coloquei um disco na vitrola e uma água pra ferver, vesti uma jaqueta a prova d’agua e um par de sacolas dessas de mercado por cima da meia, meu tênis está furado e se não faço isso molha o diabo da meia, alimentei as galinhas e fui buscar um pouco de lenha que estou estocando na lateral da casa, não imaginei que a chuva poderia cair de lado e parte da madeira molhou, principalmente as de cima.
Tomei quase uma garrafa de café hoje cedo, limpei alguns discos novos que ganhei junto com minha nova vitrola, batizei ela de Elis, ja trabalhou bastante nesses primeiros dias aqui comigo, foi de uma tia minha, depois passou para uma prima, depois foi para um tio… e agora está aqui no Paleobergue, falando em hostel, hoje pela manhã também
fechei mais algumas reservas para Junho, esse mês de Maio está bem fraco, preciso pensar num plano B pra quando o movimento estiver assim, acho que foi o mês de Abril com seus tantos feriados que atrapalhou esse mês, ainda estou aprendendo como funciona esse negócio todo, preciso me dedicar mais, principalmente agora que decidi que vou comprar essa casa, pra quem não sabe os aposentos em que montei o Paleobergue é alugado e está a venda, não sei exatamente como farei, mas primeiro a gente vira a proa do barco… depois a gente vê a condição do mar, tenho tocado dessa forma e até que venho me saindo bem.

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Canção do moribundo.

Escrevi a canção abaixo para um garoto que fazia dupla com seu cachorro batuqueiro, eles rodaram a América do Sul cantando essa canção que escrevi, numa manhã gelada debaixo de um céu de Van Gogh tomando um café, quente e coado no pano. Chama-se Canção do Moribundo, há uma foto dessa dupla lá no perfil do instagran.

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Segunda-feira, 24 de Abril.

São 5:13 da manhã, acordei com o Everest e a Mantiqueira latindo de um lado para o outro, de certo algum bicho passando por aqui, na ultima sexta-feira meu irmão Deco viu um javali passando a poucos metros dele, varando o terreno do Paleobergue e atravessando a estrada de terra até adentrar a cerca de arame do vizinho, era pouco mais de 8 da manhã e se passaram 2 dias, mas ele ainda está falando disso.

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Aniversário de minha mãe e algumas lembranças da infância.

11:43p.m segunda – feira, 17 de Abril.

Amanhã é aniversário de Dona Penha minha mãe, confesso que eu não lembrava, a pouco eu estava aqui na mesa escrevendo uma carta para um senhor que tem uma balança vermelha, dessas de avícola, quando meu irmao, me causando um susto e tanto, porque pensei que já estava a dormir lá no mezanino, disparou:
– MANO ANIVERSÁRIO DA MÃE AMANHÃ.
– Amanhã? Quem falou?
– Quem falou? Dia 18… acabei de ver aqui no celular que hoje é 17.
– De Abril?
Aqui nas Gerais a gente se perde no tempo. Dona Penha minha mãe é uma mulher ímpar, eu e meus irmãos, falo com segurança por eles, somos de uma gratidão sem tamanho pela forma que fomos criados… Continuar lendo “Aniversário de minha mãe e algumas lembranças da infância.”

Sonhos não envelhecem.

Sonhos não envelhecem.A primeira vez que li a frase acima ela estava escrita em um colchão velho. Escrita em letras garrafais com tinta preta sob um colchão de casal amarelado, jogado numa caçamba dessas de entulho de construção, o colchão parecia ter sido usado até o seu limite, e depois que ficou velho foi descartado.

Era uma quarta-feira, sei porque havia acabado de passar em frente a um boteco e as pessoas pareciam agitadas por conta do futebol que passava na TV.

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5:40a.m Quinta-feira, 23 de Março.

Terceiro dia do Outono, me encontro sentado de frente pra janela, de costas pra cozinha com os cotovelos apoiados na mesa, tomando café, ouvindo o lado B de “under the red sky” do Dylan, LP que trouxe de BH. 
Vesti um par de meias antes de sair da cama, o mesmo par que tirei ontem antes de dormi, ainda bem que são pretas, porque o chão não está dos mais limpos, se fossem brancas certamente iriam encardir. 

Esse é meu primeiro Outono aqui na casa da Estrada do Rio Manso, lembro como se fosse ontem dessa estação na Terra Fria ano passado, as manhãs se mostravam frias e no decorrer do dia o sol passava por cima da casa, geralmente o céu estava azul, quase que sem nuvens, mesmo assim fazia um frio de usar meias nos pés o dia todo, aquele piso de cimento queimado e aquelas janelas de madeira não ajudavam muito.

Antes mesmo de chegar o inverno tive de instalar uma salamandra na sala, vinha gastando muita lenha no fogão e ainda demorava a esquentar a casa, a salamandra no canto da sala se mostrou eficiente por demais, perdi as contas de quantas noites dormi no sofá com os pés virados pra ela. Everest gostava também mas tinha medo, não sei quem foi o patife que contou pra ele que tinha um diabo dentro da salamandra, quando eu estava junto ele ficava por perto, percebi um dia que quando eu saía da sala ele deitava na outra ponta do tapete, tempos depois ele me confessou que era por causa do diabo que ali residia.

– Que besteira Everest, quem lhe contou essa asneira?

– não lembro, mas me contaram e não parecia conversa fiada!

– Quanta bobagem, o que eu lhe disse certa vez sobre deus?

– que ele não existe.

– Oras… se deus não existe porque diabos haveria de existir o diabo meu caro?

– sabe que eu não tinha pensado nisso.

– Eu sei, você é um cabeça de vento as vezes camarada, aproveite a madeira a queimar e trate de se esquentar perto da salamandra!

– assim como a vida né? 

– Assim como a vida o que Everest? 

– aproveitar a quentura do fogo, como devemos aproveitar a vida, como se fosse o ultimo pedaço de lenha a queimar…

– Exato Everest, bem dessa forma aí camarada.

– o fato de que ela nunca acontecerá de novo, é o que torna a vida tão bela.

– Onde leu isso Everest?

– em um livro azul que você esqueceu na mesa certo dia desses.

– Sei… o que mais leu nele? 

– ponha mais lenha aí… agora que não tem mais diabo nenhum vamos esquentar essa sala.

Terra Fria, 19 de Setembro de 2016.

Ontem sem ter o que postar partilhei algumas camisetas a secar no varal em Passa Quatro, comentaram aqui que quando isso acontecer pra eu postar foto do patife do Everest! Então segue essa as 3 horas da ultima madrugada.

– ei acorda! abre a porta, quero sair.

– Que horas são?

– não sei, não tenho relógio.

– Everest… são 3 horas camarada, volte a dormir. Olhe aqui deixa eu tirar uma foto sua.

– eu preciso mijar, vai lá abrir a porta depois você volta a dormir.

– Quem acendeu a luz?

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Uma dúzia de coisas.

6:25a.m, Terça-feira 7 de Março.
Acordei com uma dúzia de coisas na cabeça, hoje é terça-feira e amanhã devo tomar rumo pra Belo Horizonte, devo pousar na casa de uma amiga e na quinta ou sexta virar a proa pra Ipatinga, vou lá assistir a Lili palestrar e rever alguns amigos, pensei em ir de trem pras bandas do Vale do Aço, aaahhh como eu gosto de viajar de trem… ver as montanhas através daquelas janelas grandes, mas a grana tá curta então devo de arrumar uma carona, deve de ter gente indo pra lá em um desses 2 dias que falei.

Dormi no mezanino, levantei cedo com o canto do galo, esse carinha me persegue, quando durmo no Yellow Submarine ele canta na janela do quarto, quando durmo no mezanino parece que fica a dar voltas no hostel cantando feito um bêbado na madrugada.

O dia amanheceu como a dias não o fazia, com o sol invadindo a sala, desenhando a sombra das madeiras da janela nos tijolos do balcão da cozinha, pude ver também, pelos vidros da porta principal do albergue, a galinha marrom beliscando uma cabeça de peixe, inclinei para a esquerda e então avistei o Everest dormindo na poltrona da sala, só pudera, ele não deixaria a penosa encostar nas cabeças dele se estivesse lá fora.

Desci, coloquei uma água no fogo e um disco do Bob Dylan, gosto de começar o dia assim, com café e Dylan na vitrola, em BH deve ter bastante sebo, se por ventura eu conseguir uma carona que me poupe algumas pratas, penso que devo trazer um par de discos novos.

Eu comecei um texto semana passada que simplesmente não consegui terminar, a dificuldade de descrever um par de olhos conseguiu superar a dificuldade de escrever sobre pessoas, talvez o café de hoje ajude, vou aproveitar que acordei cedo e sentar a bunda na poltrona da sala, do lado da que o Everest ainda se encontra dormindo.

Tirei a foto que ilustra a postagem, nela uma caneca verde com café preto e o moedor de minha vó Elza que fica preso na mesa, quando fixado aonde está, tem função apenas decorativa, quando preciso usá-lo tenho de mudar de lado para conseguir girar.

Pensei em escrever sobre a vontade que eu tenho de ter lembranças de uma vida que nunca tive, sempre abro um sorriso e tanto quando leio textos que remetem a saudade de coisas que muito me agradam, não que eu tenha tido uma infância ruim, longe disso… mas nunca comi ovo caipira, nem criei galinhas, nem me lambuzei comendo manga embaixo de uma mangueira… as lembranças que gustativas que tenho de minha infância remetem a danone e bolacha passatempo, era capaz de comer um pacote inteiro mergulhando a bolacha dentro do danone, minha mãe fazia compra de mês, chegava no fim da tarde com aquele mundareu de sacolas brancas, era um trabalho árduo achar as sacolas que continham as bolachas, em meio a comidas, produto de limpeza, sabonetes e outras coisas. Essa fatia da compra do “mês” acabava na primeira semana, e então ficávamos, eu e meus irmãos, 3 semanas sem bolacha ou qualquer outro doce que as vezes haviam sigo comprados, acabei desistindo de escrever sobre isso e não fiz o texto.

Eu não gosto de filtros nas fotos, também não gosto de maquiagem nas moças, sempre foi do meu agrado cara limpa, sei que as moças ficam lindas quando vestidas e pintadas para casamentos, sei também que as vezes a usam para corrigir algumas “imperfeições”, mas nada supera um rosto lavado, com um cabelo bagunçado e uma camiseta branca velha, dessas de banda de rock dos anos 80 ou 90.

Algumas vezes eu uso filtros em minhas fotos numa tentativa de melhorar a qualidade, porque meu celular não ajuda, essa foto ficou boa sem filtro, mas quando passei para P&B, o reflexo do forro branco encardido se fez presente no café, daria pra fazer uma analogia com esse lance todo de filtro, maquiagem, reflexo no café… mas o sol já está a esquentar minhas costas e o tal texto sobre os tais olhos, mais uma vez não o terminei, talvez seja preciso um pouco mais que um café e um disco do Dylan para isso, talvez seja preciso vê-los novamente.

Quando recusei um café no meio de um treino.

Texto originalmente postado no instagran.

11:45p.m sábado, 20 de Fevereiro 2016

Achei ter batido o meu recorde no trajeto Livraria X Paleobergue hoje, na varanda do meu abrigo aqui na terra fria, já protegido da chuva que não deu trégua um minuto sequer, tirei meu celular do bolso e mesmo com ele dentro de 2 saquinhos de plásticos, desses usados para congelar alimentos, pude ver que ainda era 11:12p.m. Por mil diabos, teria eu feito 11km em 42 minutos debaixo de chuva, em cima de lama… com um bocado de subida e chovendo que era o demônio… ainda havia parado para tomar água em São Sebastião das Três Orelhas em um bar de umas amiga que me ofereceram um café mas aceitei apenas água. Algo devia de estar errado, nem em noites de estrada seca, céu aberto com a lua dando folga para a headlamp eu tinha feito um tempo tão bom voltando da labuta. 

Tratei de tirar o pisante molhado e sujo de barro ali mesmo na varanda, atravessei para o banheiro com o shorts pingando chuva na sala e corri para o chuveiro. 

O paleobergue deve ser um abrigo na montanha muito do simples, nessas avaliações de “estrelas” ele deve receber uma nota de 3 estrelas, negativas é claro, mas basta olhar pela janela em noite de céu aberto que dou um dente da frente se algum hotel tiver mais estrelas que minha morada, não sei porque escrevi isso….

Lembrei… Eu queria falar do meu chuveiro, o banheiro é pequeno mas o chuveiro é a gás… a água sai quente feito uma discoteca no inferno e com uma pressão sem igual, bate de frente com qualquer chuveiro de hotel 5 estrelas por aí, mesmo eu nunca tendo freqüentado um para saber, acredito que seja bom.

Cinco minutos de ducha quente, esqueci de levar toalha e tive de subir as escadas para o sótão como vim ao mundo, nunca me vesti tão rápido, faz um frio danado nessa Terra. Calça de moletom, fleece azul do Cruce e um par de meias velhas, agora era só fazer um chá e esperar o sono dar as caras. 

Só fazer um chá ? O patife aí comprou um segundo botijão de gás não é mesmo ?

Falei comigo mesmo, diabos, demônios malditos… eu ainda não comprei um segundo botijão de gás, toda vez que vou usar o fogão tenho de ir lá fora tirar o gás do chuveiro e trazer o botijão pra dentro, um trabalho fácil mas que com essa chuva e de banho tomado…. quase que desisti do chá, mas vesti um par de galochas, presente de minha irmã, e uma senhora jaqueta impermeável, fui e voltei molhando apenas um pouco da calça na altura dos joelhos.

Enquanto a água fervia tratei de colocar o pó no coador, na ultima colher lembrei que queria tomar um chá e não café, mas aí fiquei com vontade de tomar café e me peguei pensando por que cargas d’água eu não aceitei aquele café que me foi oferecido em São Sebastião das 3 Orelhas, um cafezinho renova a vida no meio do treino e eu o recusei, que noite estranha, café recusado, recorde batido em condições adversas.

Repassei tudo que aconteceu naquela parada, entrei molhado, cumprimentei a todos de longe para não molhar mais ainda o chão, e pedi as meninas um copo de água. 

– Olá, boa noite.

– Saulo andando na chuva? 

– Não, estou correndo… Voltando da labuta no café. Pode me arrumar um pouco d’água ? 

– Claro, aceita um café ? 

– Não obrigado, apenas água mesmo. 

Reconheci alguns rostos, clientes do Café, balancei a cabeça num sinal de positivo devolvi o americano que tomei por duas vezes água e fui saindo… “hoje nos devolvem a hora que nos tiraram a alguns meses atrás”, ouvi e olhei para trás, não era comigo.

Não descobri porque recusei o café lá em Sebastião das 3 orelhas mas descobri que não fiz em 42 minutos a volta pra casa, terminava então o horário de verão.

Quintas-feiras do ano passado.

Texto originalmente postado no instagran.

09:45a.m quinta-feira, 17 de Março. 2016.

As manhãs de quintas feiras são um tanto diferente das demais manhãs aqui na Terra Fria, não me refiro ao barulho do rio ou ao galo que parece cada dia cantar mais cedo, é uma falta de pontualidade que quando o bicho canto só sei que é cedo, mas não da pra saber se é quatro, cinco ou 6 da manhã. Dia desses cantou na casa das três e meia, eu havia ido dormir quase que uma da madruga… Não foi o suficientes para me fazer levantar, voltei a dormir e só despertei por volta das oito. 

Tive de reler o começo para ver do que estava falando, maldito galo que além de atrapalhar meu sono agora deu para atrapalhar minha prosa, enfim dizia eu sobre as manhãs de quinta-feira… são diferentes porque é o dia da semana que começa a labuta no livraria, nos 3 dias que antecedem a quinta eu não tenho muito que me preocupar com a hora, levanto que nem o celular pego para ver o horário, acabo que acordo cedo porque já é de costume e logo trato de passar um café e colocar alguma disco pra girar na minha vitrola. 

Em dia de quinta a primeira coisa que faço é ver a hora, ela define se vou calçar um tênis depois de passar um café e mandar um treino até a labuta, ou se terei de pegar uma carona para chegar a tempo de limpar a livraria antes de abrir. 

Hoje por exemplo, até acordei a tempo de ir na base do treino, mas deixei um bocado de coisa para fazer como a louça de ontem e o banheiro para limpar. Ainda deu tempo de moer um café e sentar aqui na varanda pra escrever essas coisas aqui, para ilustrar o post deixo essa foto da janela da sala e agora vou para a estrada tomar uma carona até a cidade.